domingo, 18 de novembro de 2012

Zumbi também é cultura

Interessante mesa redonda sobre questões científicas, sociais e políticas relacionadas a ideia de um apocalipse zumbi que teve como participantes o escritor bestseller Max Brooks, autor de 'World War Z', que está sendo adaptado para o cinema, e 'Zombie Survival Guide'; Matt Mogk, diretor da Zombie Research Society e autor de 'Everything You Ever Wanted to Know About Zombies'; do médico psiquiatra Steven Schlozman, da Harvard Medical School  que escreveu 'The Zombie Autopsies'; e dos escritores Scott Kenemore, autor de 'Zen of Zombie', ' Z.E.O.' e 'Zombie' e James Lowder, autor de 'Prince of Lies' e editor do livro 'Triumph of The Walking Dead'; além do neurocientista Bradley Voytek, pesquisador da Universidade da California, em Berkeley que escreveu 'Scanning the Zombie Brain'.


domingo, 30 de setembro de 2012

Nas profundezas do oceano.

Quando eu era bem pirralho, fazia meu pai me contar histórias sob medida, frequentemente corrigindo o desenrolar do enredo e os detalhes do cenário e ambientação. Eu dava o argumento e ele tinha que desenvolver o roteiro, mas eu tinha sempre a palavra final e o mantinha na linha. Afinal, quem mais sabe o que uma criança quer ouvir do que ela própria? 

Um dos meus cenários favoritos envolvia algum tipo de aventura submarina, muitas vezes passada em abismos profundos e em que o protagonista (o meu alterego mais corajoso, adulto e bem equipado) enfrentava condições extremas com aparatos tecnológicos de ponta, vivendo situações de extremo risco ao ter que lidar com criaturas fantásticas, como lulas gigantes ou tubarões de alta profundidade de seis e sete guelras. 

Minhas fontes, na época, eram dicionários enciclopédicos e enciclopédias, como o KLS e a Barsa, e os documentários sobre vida animal que passavam domingo de manhã nas TVs abertas. Percebam que falo de uma época em que TVs por assinatura eram sonhos de consumo distantes de adultos que haviam tomado conhecimento deste serviço no mercado Norte-Americano. Essas coisas não existiam no Brasil. 

Para minha sorte, a falta de fontes mais atualizadas e mais específicas, associado ao fato do meu próprio senso crítico estar ainda longe de minimamente maduro, me cegava para certas incoerências e inconsistências das tramas, me permitindo vivenciar aventuras mais dramáticas do que seriam se eu realmente pudesse levar em conta todos os detalhes técnicos envolvidos nas situações e cenários com que eu e meu pai lidávamos. Mas isso não quer dizer que eu deixasse minha imaginação correr desenfreada, pois aquilo que eu sabia eu aplicava, ou melhor, fazia meu pai aplicar na história.

Hoje com a quantidade absurda de fontes livres na internet não sei onde minha imaginação poderia ter me levado, mesmo sendo mais facilmente tolido por um lado ao me deparar com certas dificuldades técnicas, por outro, sem dúvida os cenários e temas poderiam se multiplicar e novas ideias certamente seriam fáceis de serem incorporadas. 

Talvez, simplesmente, eu ficasse entretido com outras coisas mais frívolas e mais facilmente absorvíveis para uma criança com menos de oito anos e, possivelmente, jamais descobrisse essas e outras maravilhas que hoje estão a poucos cliques de distância de cada um de nós. Mas, quem sabe, minha imaginação não teria se desenvolvido ainda mais e eu, e meu pai, poderíamos ter cocriado histórias ainda mais realistas e interessantes, uma vez que o ímpeto de contornar certas impossibilidades poderia ser ainda mais divertido e fecundo. Realmente eu não sei. O que sei é que até hoje sou fascinado pela exploração dos oceanos e tecnologias de exploração submarina, além de só ter aumentando meu interesse por criaturas das profundezas como lulas gigantes e grande (e pequenos) tubarões de águas profundas. 

 
Uma das coisas que me lembro é que tinha uma fascinação por escafandros e especialmente por trajes  'atmosféricos de mergulho' que são basicamente submarinos individuais com braços e pernas que mantém a pressão atmosférica da superfície e nos quais, por causa disso, os 'mergulhadores' não estão sujeitos aos problemas associados a pressão e principalmente a descompressão que ocorreriam caso eles usassem trajes convencionais, além de permitirem que seus usuários desçam muito mais fundo.

Estes trajes atualmente são exemplificados pelos 'newsuits' que possuem sistemas de auto-propulsão e são mais elegantes que os que serviam de ilustração nas enciclopédias e dicionários que eu dispunha. Para quem era fã, como eu, de Jacques Cousteau e do 'Laboratório Sumarino' (a versão original, e não a versão do 'Adult Swim' que só fui virar fã depois de bem adulto, claro) já era claro que mergulhar em águas profundas era algo mais complexo que demandava muita preparação e precauções extras com acertar a mistura respiratória, determinar sua duração e o tempo e taxa de subida do mergulho, quando não demandaria mesmo a espera em pequenas e claustrofóbicas câmaras de saturação e descompressão por horas, se não dias ou mesmo semanas. O trabalho em plataformas de petróleo no Brasil e no exterior que era tema de programas jornalísticos como Globo Repórter também me ensinou muito sobre isso, diga-se de passagem. O fato de eu ter um primo que trabalhava na área também sempre me inspirava e mantinha este mundo muito perto de mim.

Assim, os trajes atmosféricos eram uma excelente saída para evitar os problemas da exploração submarina tradicional, permitindo aventuras mais enxutas e rápidas em que os heróis pudessem chegar mais fundo e retornar a superfície em questões de no máximo poucas horas. Essas coisas não eram tão claras para mim quando eu era criança, mas já estavam implícitas em várias das minhas escolhas e muitas vezes já em um estado relativamente bem consciente, ainda que os detalhes não estivessem nada claros.

Admito que eu era mais displicente com a questão zoológica das tramas, embora essa fosse a minha paixão. Eu exigia não só lulas gigantes, como polvos gigantescos, muito maiores do que os conhecidos e bem mais agressivos que os que são encontrados no atlântico norte, o que fazia claramente flertar com a criptzoologia e com o lado mais 'fringe' das ciências, uma vez que estes tipos de animais ainda não passam de mitos e exageros. Eu buscava algo como os equivalentes (com esteróides) das lulas Humboldt com toda sua característica voracidade e beleza ímpar, mas bem maiores. 

Os tubarões eram outra paixão e devo muito desta paixão aos meus livros da coleção 'Os Bichos' em que através de ilustrações realistas eram retratadas diversas criaturas de várias épocas e localizações geográficas, com detalhes suficientes para deixar garotos de menos de 11 anos completamente fascinados. 


O ponto interessante é que com o passar dos anos e com minha entrada na faculdade me tornei um pouco mais cético de algumas informações ali descritas, especialmente por que eram bastante desatualizadas. Porém, para a minha surpresa assim que os documentários de TV sobre  vida selvagem começaram a se tornar muito mais comuns e canais como Discovery Channel e NatGeo, além da boa é velha BBC, começaram a se tornar mais conhecidos, acabei por descobrir que mesmo algumas das afirmações mais impressionantes daquela coleção de livros tinha uma boa base factual. Os tubarões brancos saltadores são o exemplo que me lembro melhor e que até hoje me deixam impressionado.


Muitas das informações que dispunha através dos livros eram 10 ou 20 anos desatualizadas e os registros de animais de águas profundas vinham de coletas em redes de pesca e poucas visitas com batiscafos e submersíveis a estas localidades remotas, mas isso mudou e pude acompanhar esta mudança. Atualmente, com ROVs e tecnologias semelhantes, inclusive não destinadas a pesquisa oceanográfica mas sim a prospecção  e manutenção de plataformas de petróleo, temos muito mais informações sobre essas fantásticas criaturas que estão se acumulando e que podem ser facilmente encontradas pela internet em um passeio por um site como o youtube.  


O barateamento dos equipamentos de mergulho e cinematografia submarina também permitiu vários registros desses animais em águas relativamente mais rasas em que a proximidade entre os seres humanos e estes animais é muito grande. Estes vídeos de tubarões de seis guelras filmados por mergulhadores são incríveis e existem aos montes por aí.


Todavia, ainda acho que as lulas gigantes e colossais (Architeuthis e Mesonychoteuthis) merecem um destaque especial, pois graças ao trabalho de vários cientistas, especialmente o neozelandês Steve O'Shea, estes fantásticos animais têm sido cada vez mais estudados e as informações sobre eles cada vez mais divulgadas, tanto a partir de análises de animais mortos presos em linhas e redes de pescas  (com direito a autópsias transmitidas ao vivo) ou encalhados nas praias como a partir de vídeos de exemplares ainda vivos durante a sua alimentação 'pegos no ato' por câmeras automáticas que nos dão um vislumbre maior da magnitude desses seres e do quanto temos a descobrir investigando as profundesas dos oceanos.

É bom e profundamente excitante ver 'sonhos de criança' materializando-se em fatos e conhecimento compartilhado, mesmo que não sejam tão mirabolantes e heróicos como eram minhas primeiras impressões destes temas projetadas nas histórias que fazia meu pai me contar. Mas, sem dúvida, a realidade também tem sua dose de surpresas que valem sempre a pena e muitas vezes superam qualquer ficção, mesmo a de um menino com a cabeça nas profundesas do mar.

Vivemos em período peculiar da história humana em que o acesso ao conhecimento é extremamente facilitado e no qual o próprio conhecimento é abundante, mas em que, ao mesmo tempo, existem tantas coisas a serem vistas e tantas distrações que não nos apercebemos desta facilidade e, pior,  não valorizamos as possibilidades abertas pelas novas mídias e os tesouros que estão logo na frente de nossos narizes. Literalmente falando!

Mulheres, cuidado! Estamos dentro dos seus cérebros!!


Publicado anteriormente em calmaria&tempestade em: Mulheres, cuidado! Estamos dentro dos seus cérebros!!

Não, isso não é exatamente uma metáfora, mas a constatação que DNA de células masculinas, muito provavelmente advindos de um feto gestado ou de irmãos gêmeos que compartilharam um útero, são frequentemente encontrados nos cérebros de mulheres [1]. Esta interessante descoberta foi divulgado no dia 26 de setembro, em artigo da revista PLoS ONE  [2].
Este artigo é a primeira vez que cientistas demonstram o fenômeno chamado de microquimerismo e, células do cérebro humano. O microquimerismo oc0rre quando células originadas em um indivíduo integram-se os tecidos do outro, neste caso específico no cérebro humano [1].
Essa não é a primeira vez, entretanto, que, em nós seres humanos, este fenômeno de microquimerismo adquirido naturalmente foi observado. Em outros tecidos e órgãos, diferentes do cérebro, isso já havia sido constatado. O microquimerismo fetal, bem como a origem materna havia recentemente sido relatada nos cérebros de camundongos. No estudo publicado pela revista PloS One, os cientistas conseguiram quantificar DNA masculino no cérebro humano feminino, como um marcador para microquimerismo de origem fetal, ou seja, a aquisição por parte de um mulher de DNA masculino enquanto estivesse gestando um feto masculino [2]
Os pesquisadores, usando o gene específico do cromossomo Y DYS14 como marcador e empregando a técnica de PCR quantitativo em tempo real em amostras de cérebro autopsiados de 26 mulheres sem evidências clínicas ou patológicas da doença neurológica e 33 mulheres que tiveram a doença de Alzheimer, conseguiram observar que 63% das mulheres, i.e, 37 das 59, testadas apresentava microquimerismo masculino em seus cérebros, estando este marcador presente em várias regiões dos seus cérebros [2].
De acordo com os autores do trabalho, estes dados sugerem, entretanto, uma prevalência menor (p = 0,03) e também menor concentração (p = 0,06), ainda que neste caso as diferenças sejam estatisticamente insignificantes, do microquimerismo masculino em cérebros de mulheres com a doença de Alzheimer do que nos cérebros das mulheres sem esta patologia [2].
Os pesquisadores não tem ideia se estas correlações querem dizer algo a mais. Como explica William Burlingham, da Universidade de Wisconsin, que se especializou em cirurgia de transplante estuda o microquimerismo no contexto da tolerância imunológica, e que não estava envolvido no estudo publicado no PloS One [1].
“É uma correlação”, “Mas, como um monte de coisas no campo de microquimerismo, você não sabe exatamente o que a correlação significa ainda.” [1]
O próximo passo da pesquisa de acordo com J. Lee Nelson, a pesquisador sênior responsável pelo artigo, é avaliar o microquimerismo no cérebro fetal e investigar caso as células microchimericas estabelecem ou não células funcionais nos cérebros dos indivíduos em formação [1].
Estes resultados sugerem fortemente que este não é um fenômeno raro, na verdade o microquimerismo masculino parece ser frequente e amplamente distribuído nos cérebros das mulheres [2].
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Referências:
  1. Mole, Beth Marie Swapping DNA in the Womb The Scientist News & Opinion September 27, 2012
  2. Chan WFN, Gurnot C, Montine TJ, Sonnen JA, Guthrie KA, et al. (2012) Male Microchimerism in the Human Female Brain. PLoS ONE 7(9): e45592. doi:10.1371/journal.pone.0045592

    Credito das Figuras:
    MARIA TEIJEIRO/SCIENCE PHOTO LIBRARY

terça-feira, 10 de julho de 2012

As bactérias arsênicas que no final não eram tão arsênicas assim:

Nada de ‘biosfera das sombras’ e também nada de termos que reescrever os livros-texto de biologia. Os vários problemas metodológicos do trabalho original realmente interferiram com as conclusões do trabalho original e os resultados eram artefatos e não podiam suportar as conclusões mais fortes do grupo original de pesquisadores por trás do artigo da Science. Os diversos métodos que eles usaram para inferir que a GFAJ-1 incorporaria arseniato no lugar do fosfato, simplesmente, não eram indicados para tal tarefa.



Rosie Redfield, uma das mais ativas críticas do trabalho original, foi uma das responsáveis por um dos dois estudos [1,2] que refutaram as conclusões de Wolfe-Simon e colaboradores (2011) [3,4]. Ela e vários colaboradores simplesmente cultivaram as mesmas bactérias em condições ricas em arseniato, isolaram seu DNA, mandando-o para que fosse analisado por cientistas em Princeton por métodos mais sensíveis e precisos, e nada de arseniato foi encontrado nessas biomoléculas. O outro grupo liderado por Julia A. Vorholt testou se essas mesmas bactérias sobreviviam realmente sem fosfato em meios mais cuidadosamente preparados e controlados do que os usados pelo grupo de Ronald S. Oremland, e no trabalho liderado pela geomicrobiologista Felisa Wolfe-Simon, e quando fizeram isso, a GFAJ-1, não cresceu.



Os dois estudos servem para mostrar a ciência em seu melhor, se autocorrigindo e controlando a 'hype' criada pela NASA e de certa forma permitida e estimulada pelos autores do artigo original da Science, publicado online em 2010 e na versão imprensa em 2011. Este caso também mostra a importância dos blogs como veículos para a crítica em ciência e que possibilitam rápido acesso, pelo público interessado, a essas críticas, além de deixar claro o problema das expectativas dos cientistas na prática científica e da pressão das agências financiadoras, no caso em particula, que organizou a já notória conferência de imprensa que começou com essa história e onde as especulações mais exageradas foram emitidas. O artigo não deveria ter sido publicado com aquelas conclusões sem que outros testes adicionais fossem feitos já que as condições de cultura estavam longe de serem as ideias para que as conclusões pudessem ter um respaldo maior. Além disso, o grupo - especialmente através de seu líder Ronald S. Oremland - há muito tempo já vinha especulando sobre a ‘vida baseada em arsênio’ e sobre a possibilidade de encontrar um ‘biosfera das sombras’ aqui mesmo na terra, ou seja, organismos com uma bioquímica alternativa e que pudessem servir de modelo para o que poderíamos esperar encontrar em outros mundos. Outro co-autor do estudo, o astrofísico e astrobiólogo Paul C. Davies (cujo livro ‘O misterioso silêncio‘ já foi comentado aqui no blog), também é outro que tem levado entusiasticamente a sério a ideia de encontrar, aqui mesmo na terra, esses exemplos de bioquímica alternativa, o que ajuda a dar um pano de fundo para a polêmica e, quem sabe, a explicar por que os autores foram tão descuidados em suas conclusões.
Essa situação nos força a nos defrontamos com os aspectos sociais e psicológicos da comunidade científica e nos mostram a importância de compreendermos as ciências como empreitadas coletivas críticas e solidárias e não como o trabalho de pessoas ou grupos isolados e nem de estudos únicos.
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  1. Reaves ML, Sinha S, Rabinowitz JD, Kruglyak L, Redfield RJ. Absence of Detectable Arsenate in DNA from Arsenate-Grown GFAJ-1 Cells. Science. 2012 Jul 8. [Published Online July 8 2012] doi: 10.1126/science.1219861
  2. Erb TJ, Kiefer P, Hattendorf B, Günther D, Vorholt JA. GFAJ-1 Is an Arsenate-Resistant, Phosphate-Dependent Organism. Science. 2012 Jul 8. [Published Online July 8 2012] Science doi: 10.1126/science.1218455
  3. Wolfe-Simon, F. et al. A bacterium that can grow by using arsenic instead of phosphorus. Science. Published online Dec 2, 2010. doi:10.1126/science.1197258
  4. Wolfe-Simon F, Switzer Blum J, Kulp TR, Gordon GW, Hoeft SE, Pett-Ridge J,Stolz JF, Webb SM, Weber PK, Davies PC, Anbar AD, Oremland RS. A bacterium that can grow by using arsenic instead of phosphorus. Science. 2011 Jun 3;332(6034):1163-6. doi: 10.1126/science.1197258
  5. Davies, Paul A shadow biosphere Cosmos magazine Issue 32, April 2010.
Créditos das Figuras:
As fotos dos protagonistas foram retiradas de seus sites pessoais ou institucionias.
Mono Lake, California, where the bacteria were found FLICKR CREATIVE COMMONS, JERRY KIRKHART

domingo, 1 de julho de 2012

E eu vos apresento: o 'Bloop' (Verdadeiro e o Falso)

Abaixo está a imagem do espectrograma do famoso 'Bloop', o misterioso som registrado, em 1997, pelos hidrofones do NOAA e o próprio dito cujo, acelerado 16X.


Agora segue  a versão do Pseudo-documentário, 'Sereias', do Animal Planet direto da chamada televisiva Brasileira de 2011:


Forçadinho, não é?

sexta-feira, 29 de junho de 2012

De novo a história das sereias


Esta semana no Brasil deve reprisar o famigerado docuficção "Sereias" (Mermaids: A Body Found) no Animal Planet, sobre o qual já havia comentado (“De dragões à sereias”), e que já havia reprisado, cerca de duas semanas atrás, nas TVs dos EUA. Mais uma vez várias pessoas caíram na lorota e não perceberam que esse, assim como o outro sobre Dragões ("Dragons: A Fantasy Made Real"), são apenas encenações que procuram mostrar o que aconteceria caso essas criaturas existissem de fato. Os cientistas descritos em ambos os programas não existem e não há quaisquer trabalhos sobre os 'fatos' relatados nesses programas de TV publicados em qualquer periódico científico.

Após a exibição da reprise do programa da sereias vários cientistas, inclusive biólogos marinhos (Deep Sea News e Brian Switek), se manifestaram chocados com a falta de cuidado do Animal Planet e dos produtores do programa de TV. O pior de tudo é que, assim como o CDC - que havia criado uma página usando o tema Zumbi para prevenir as pessoas para as estratégias para sobreviver a epidemias normais (Veja “Apocalipse Zumbi - O CDC está preparado, mas vc está?”), mas depois dos incidentes em Miami teve que emitir uma nota, em resposta a um e-mail de um jornalista do Huffington Post, avisando que não existem evidências de vírus ou patógenos que transformem as pessoas em zumbis ou os façam comportarem-se de maneira semelhante - o NOAA, que é amplamente citado no “Sereias” (e foi a instituição que gravou o Bloop que inspirou todo o roteiro do especial, juntamente com a hipótese pseudocientífica do 'Macaco Aquático', também acabou emitindo uma nota de esclarecimento que segue em tradução minha:
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“Sereias - os meio-humanos, meio-peixe 'sirênios'* do mar - são criaturas marinhas lendárias narradas em culturas marítimas desde tempos imemoriais. O poeta épico grego Homero escreveu sobre elas em a Odisséia. No antigo extremo Oriente, as sereias eram as esposas dos poderosos dragões do mar, e serviam como mensageiros de confiança entre seus cônjuges e os imperadores em terra. Os povos aborígines da Austrália chamam as sereias yawkyawks - um nome que pode referir-se às suas músicas hipnotizantes.

[Rendição de artista do século 19 das sereias no mar]

A crença em sereias pode ter surgido no alvorecer de nossa espécie. Figuras femininas mágicas aparecem pela primeira vez em pinturas rupestres no final do período Paleolítico (Idade da Pedra) cerca de 30.000 anos atrás, quando os humanos modernos ganharam o domínio sobre a terra e, presumivelmente, começaram a navegar pelos mares. Criaturas meio-humanas , chamadas quimeras, também abundam na mitologia - além de sereias, haviam os sábios centauros, sátiros selvagens e os assustadores minotauros, para citar apenas alguns.
Mas são as sereias de verdade? Nenhuma evidência de humanóides aquáticos jamais foi encontrada. Por que, então, eles ocupam o inconsciente coletivo de quase todos os povos marítimos? Essa é uma pergunta melhor deixada para os historiadores, filósofos e antropólogos. ” (Nota do NOAA via Pharyngula)
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Já estou antecipando as pessoas jurando de pé junto que isso tudo é verdade e os céticos estão em um complô para calar a mídia. Infelizmente, muita gente prefere apegar-se a este tipo de ilusão, não se aprofundando o suficiente nas informações para reconhecê-la como tal, ao invés de realmente investigar a fundo de maneira sistemática e cuidadosa o que está a nossa volta e assim descobrir o tanto de coisas que realmente não compreendemos e tentar, a partir daí, aprender, de verdade, sobre elas.

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* Em inglês existem os dois termos 'mermaid' (de várias mitologias, especialmente as nórdicas, mas cujo nome vem do Inglês antigo) e 'siren' (da mitologia grega) que em português são ambos traduzidos como "sereia" por isso forcei um pouco a barra e usei o termo 'sirênio' que normalmente seria mais indicado para falar dos manatins e peixes-bois (Sirenia), um grupo de mamíferos aquáticos que podem ter ajudado a criar as lendas das sereias.

quinta-feira, 14 de junho de 2012

Motörhead - Enter Sandman

Isso sim que é cover. Lemmy com sua voz doce e melodiosa cantando junto com o Motörhead, "Enter Sandman" do Metallica:




Grande música, grande Cover!

segunda-feira, 14 de maio de 2012

Controlando a mente dos animais


Publicado no calmaria&tempestade's Blog

Não é difícil encontrar exemplos de parasitas que manipulam o comportamento de seus hospedeiros de maneira a aumentarem suas próprias chances de sobrevivência e reprodução, a despeito do triste destino das criaturas por eles infectadas, mas apenas mais recentemente é que os cientistas começaram a compreender como exatamente isso ocorre. Fazem isso, por exemplo, através de estudos proteômicos os pesquisadores tem conseguido comparar os padrões de expressão de certas proteínas nos cérebros de animais infectados e não infectados, assim como, de maneiras mais diretas, ao investigarem o que ocorre em certas regiões cerebrais e com determinados neurotransmissores, como serotonina e dopamina. Desta forma, ganhando insights sobre  quais as vias neuroquímicas são sequestradas pelos parasitas  e como as moléculas que fazem parte delas estão envolvidas neste tipo de manipulação.

Em janeiro deste ano, um artigo de divulgação muito interessante saiu na revista The Scientist que ilustra um pouco sobre o que temos aprendido sobre essas bizarras estratégias de vida que parecem saídas de filmes de terror, como “Invasores de corpos” e “Enigma do outro mundo”.
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Um universo do nada

Um universo do nada | Publicado no calmaria&tempestade's Blog

Após ler (na verdade ouvir) o excelente livro do físico Lawrence Krauss “A Universe from Nothing: Why There is Something Rather Than Nothing” [1], procurando mais informações descobri um pequeno artigo, quase um resumo, escrito em 2002 para a revista Mercury por dois outros físicos, Alexei V. Filippenko, que sempre aparece nos programas da série “O Universo”, e Jay Pasachoff em que explicam, de maneira clara e simples, em que consiste exatamente a ideia de que o universo pode ter originado do nada. 

O ótimo livro de Krauss até onde sei não foi ainda publicado no Brasil, mas é possível ver um video sobre do que se trata o livro nas palavras do próprio autor:


Mas o artigo de Filippenko e Pasachoff segue em uma tradução minha já que considero ele tremendamente claro e informativo e serve como um prelúdio para o muito mais amplo e esmiuçado livro de Krauss.
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Mercury Magazine Vol. 31 No. 2 March/April 2002
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[Traduzido por Rodrigo Véras]
Insights da física moderna sugerem que nosso universo maravilhoso pode ser o derradeiro almoço grátis.
Adaptado de “The Cosmos: Astronomy in the New Millennium”, 1st edition, by Jay M. Pasachoff and Alex Filippenko, © 2001. Reproduzido com permissão de Brooks/Cole, uma marca do Grupo Wadsworth, uma divisão da Thomson Learning.

Na teoria inflacionária, a matéria, a antimatéria, e os fotons foram produzidos pela energia do falso vácuo, que foi liberada em seguida a transição de fase. Todas estas partículas consistem em energia positiva. Essa energia, no entanto, é exatamente equilibrada pela energia gravitacional negativa de tudo puxando todo o resto. Em outras palavras, a energia total do universo é zero! É notável que o universo consista essencialmente de nada, mas (felizmente para nós) em porções positivas e negativas. Você pode facilmente ver que a gravidade está associada com a energia negativa: Se você deixar cair uma bola que estava em repouso (definido como um estado de energia zero), ela ganha energia do movimento (energia cinética) enquanto cai. Mas este ganho é exatamente equilibrado por uma maior energia negativa gravitacional conforme ele chega cada vez mais perto do centro da Terra, de modo que a soma das duas energias permanece zero.

A idéia de um universo de energia zero, juntamente com a inflação, sugere que tudo que se precisa é apenas um pouquinho de energia para que a coisa toda se inicie (ou seja, um pequeno volume de energia em que a inflação possa começar). O universo então experimenta expansão inflacionária, mas sem criar energia líquida.

O que produziu a energia antes da inflação? Esta é talvez a pergunta derradeira. Tão insano quanto isso possa parecer, a energia pode ter vindo do nada! O significado do “nada” é um tanto ambíguo aqui. Pode ser o vácuo em um espaço e tempo pré-existente , ou pode ser nada mesmo – isto é, todos os conceitos de espaço e tempo teriam sido criados com o próprio universo.

A teoria quântica, e especificamente, o princípio da incerteza de Heisenberg, fornece uma explicação natural para a forma como essa energia pode ter vindo do nada. Em todo o universo, partículas e antipartículas formam-se espontaneamente e rapidamente aniquilando umas as outras sem violar a lei de conservação de energia. Estes nascimentos e mortes espontâneas dos chamados de pares de partículas “virtuais” são conhecidos como “flutuações quânticas”. De fato, experimentos de laboratório provaram que as flutuações quânticas ocorrem em todos os lugares, todo o tempo. Pares de partículas virtuais (como elétrons e pósitrons) afetam diretamente os níveis de energia dos átomos, e os níveis de energia previstos estariam em desacordo com os níveis medidos experimentalmente, caso as flutuações quânticas não fossem levadas em conta.

Talvez muitas flutuações quânticas tenham ocorrido antes do nascimento do nosso universo. A maioria delas desapareceu rapidamente. Mas uma sobreviveu o suficiente e tinha as condições adequadas para que a inflação se iniciasse. A partir daí, o volume original minúsculo inflado por um fator enorme, nosso universo macroscópico nasceu. O par partícula-antipartícula original (ou pares) podem ter posteriormente aniquilado-se um ao outro – mas mesmo se não o fizessem, a violação da conservação de energia seria minúscula, não sendo suficientemente grande para ser mensurável.

Se esta hipótese, reconhecidamente especulativa, estiver correta, então a resposta para a pergunta final é que o universo é o derradeiro almoço grátis! Ele veio do nada, e sua energia total é zero, mas, no entanto, possui uma estrutura incrível e complexidade. Poderiam até existir  muitos outros universos assim, espacialmente distintos do nosso.

Imagem: Courtesy of AURA/NOAO/NSF.
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Referências sugeridas:
  1. Krauss, Lawrence M. A Universe from Nothing: Why There Is Something Rather than Nothing Free Press, January 2012, 224 pages. [Esta referência é da versão em papel]