domingo, 10 de julho de 2011

Criogenia

Frio. Frio, até entorpecer o cérebro. Frio até congelar os neurônios. Frio até o zero Kelvin, quando a energia cessa, quando não é possível sequer um decaimento de átomo de plutônio ou o salto de um elétron e o próprio tempo pára, congelado. Frio, em suma, como nos últimos dias.
Acho que é a idade, não sei, mas a cada ano parece que o verão é mais quente e o inverno mais frio. O termômetro me desmente, é apenas meu corpo que está dando mostras do cansaço na luta contra o clima, as estações de ano passam atropelando a todos nós, sem que possamos fazer qualquer coisa.
Primeiro são as pontas dos dedos das mãos e dos pés, e logo os pés e mãos que estão inteiramente gelados, insensíveis, inutilizáveis. Uma dor genérica e inlocalizável vai se espalhando pelo corpo todo, juntas, membros, ossos, pele, tudo parece doer e reclamar ao mesmo tempo ao cansado organismo.
O cérebro, não menos espoliado, começa a sofrer a sobrecarga das reclamações que chegam dos mais variados setores do corpo, sem dar conta mais de recursos e alternativas para resolver todos os problemas. Ele mesmo começa então a operação de desligamento, frio excessivo e sobrecarga no sistema, é o que alega, e já não conseguimos mais nos orientar direito, falar, pensar, ter qualquer resquício de esperança ou humor. Nem o sol, aquele desgraçado, se atreve mais a aparecer para esquentar um pouco o dia, ficando às vezes semanas escondido atrás das nuvens.
Frio. Frio como nos cinco minutos entre a vida e a morte aprisionados embaixo do lago congelado. Frio como nos últimos momentos do alpinista que achou que a neve estava firme e não haveria avalanche. Frio como o olhar de uma mulher quando passa por você no dia seguinte àquela confusão. Frio que espeta como faca.
Por fim a solução drástica chega. Garrafas de água quente bem tampadas para esquentar a cama, as roupas, tentar aquecer o ambiente com fogo, eletricidade, atrito, qualquer meio possível, nada adianta. Entro enfim embaixo de um banho, mas nem a água esquenta o suficiente. Fico lá encolhido num canto, choramingando, com a água no mínimo, quase pingando, para que saía fervente e escalde a pele. Minha vida passa pelos meus olhos. Quanto tempo assim? Horas, dias, meses? Não sei.
Passam eras até o calor aquoso finalmente alcançar as engrenagens mais profundas do meus organismo e apertar o botão. Reiniciar a máquina. Sinto o ar encher novamente meus pulmões e aos poucos me descubro novamente vivo.

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